Código do Trabalho: 19
Categoria: Relato de Caso
Instituição de Ensino: SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE PORTO ALEGRE
Título:
MIOCARDIOPATIA NÃO-COMPACTADA OU CARDIOMIOPATIA PERIPARTO? O DESAFIO DIAGNÓSTICO NO PUÉRPERIO
Autores:
GIOVANA GOULART, GIULIA GOULART, LEONARDO BOSI MOREIRA, GIULIANO MINOR ZORTÉA, PAOLA PISSAIA, MARIA EDUARDA JERONIMO DE OLIVEIRA
Tema Livre:
Introdução: A miocardiopatia não-compactada (MNC) é uma cardiomiopatia rara, caracterizada por trabeculações ventriculares proeminentes e disfunção miocárdica, resultante de um processo de falha na compactação miocárdica durante o desenvolvimento fetal. Embora seja considerada uma condição genética, há evidências de que fatores hemodinâmicos, como gravidez, possam precipitar seu quadro clínico. A MNC compartilha características com a cardiomiopatia periparto (CMP), uma condição exclusiva do puerpério, tornando o diagnóstico diferencial essencial para o manejo adequado. O relato descreve um caso de MNC diagnosticado no pós-parto, destacando a necessidade de acompanhamento a longo prazo para diferenciar uma condição transitória de uma doença estrutural crônica.
Descrição do Caso: Puérpera, 41 anos, multípara, sem relato de descompensação cardíaca em gestações anteriores, hipertensa, tabagista e com história de abuso de substâncias, apresentou dispneia progressiva iniciada 10 dias após o parto. Relatava dispneia paroxística noturna e aos mínimos esforços, além de tosse noturna. Chegou à emergência hipertensa, taquipneica com esforço respiratório e dessaturação, crepitações pulmonares, hepatomegalia e edema de membros inferiores. Visto insuficiência cardíaca (IC) grave e insuficiência respiratória, paciente necessitou de suporte com drogas vasoativas e ventilação mecânica.
O ecocardiograma transtorácico evidenciou fração de ejeção de 28% com disfunção sistólica grave do ventrículo esquerdo (VE), hipocinesia difusa e trabeculações proeminentes em regiões apicais, sugerindo MNC. A ressonância magnética cardíaca (RMC) confirmou o diagnóstico, demonstrando relação miocárdio não-compactado/compactado > 2,3 no ápice e terço médio do VE, sem realce tardio indicativo de fibrose.
Após manejo clínico em enfermaria, recebeu alta hospitalar para seguimento ambulatorial, onde será avaliada a necessidade de cardiodesfibrilador implantável (CDI). Considerou-se a anticoagulação pelo risco tromboembólico da MNC, mas optou-se por não iniciar devido ao contexto social e ao alto risco de complicações decorrentes da má adesão terapêutica.
Conclusão: A MNC pode permanecer assintomática por anos, sendo descompensada por fatores como a sobrecarga hemodinâmica da gestação, como no caso apresentado. O diagnóstico diferencial com CMP é fundamental, uma vez que ambas as condições podem se manifestar com IC grave no puerpério. Porém, a presença de trabeculações proeminentes e a relação miocárdio não-compactado/compactado > 2,3 na RMC confirmaram o diagnóstico de MNC neste caso. Ademais, há relatos de trabeculações reversíveis na gravidez, o que reforça a importância do seguimento a longo prazo para avaliar se as alterações miocárdicas são transitórias ou permanentes. Esse acompanhamento permite decisões terapêuticas precisas, incluindo a necessidade de anticoagulação e CDI, visando reduzir riscos cardiovasculares futuros.
Palavras Chave:
CARDIOMIOPATIAS; PERÍODO PÓS-PARTO; INSUFICIÊNCIA CARDÍACA; MIOCÁRDIO VENTRICULAR NÃO COMPACTADO ISOLADO
Referências:
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